Por que nosso bem depende, em boa medida, do bem dos outros, e vice-versa?

O interesse pela promoção do bem do outro se estabeleceu pelo fato de, em última instância, proporcionar o próprio bem. O ato de ajudar o outro faz com que esse outro adquira uma maior disposição de retribuir a ajuda no futuro e, em paralelo, aumenta as chances de que esse outro sobreviva para que possa, de fato, retribuir a ajuda. 

Contudo, o ato de ajudar o outro, muitas vezes, representa um risco à nossa própria segurança, especialmente quando estamos no limiar entre a vida e a morte, como era o caso dos nossos ancestrais. Isso implica que, ao entrar em relações de reciprocidade, cada um busca e, ao mesmo tempo, compromete sua própria segurança em prol da segurança dos outros.

Vale notar que, em espécies que dependem de cooperação para a sobrevivência, como é o caso da espécie humana, a busca pelo próprio bem, por tabela, influencia o bem dos outros, pois isso faz com que o indivíduo se mantenha apto a ajudar os outros. 

Por outro lado, se esse indivíduo, por algum motivo (talvez por irrefletidamente buscar promover o bem do outro), decidir, corriqueiramente, abrir mão do seu próprio bem, não só poderá ter sua aptidão em ajudar comprometida, como também poderá se tornar um peso para o grupo, uma vez que é provável que seja ele quem acabará precisando de ajuda dos outros.

O ponto é que somos seres muito vulneráveis aos perigos da realidade, se comparados com outros animais (especialmente nos nossos primeiros anos de vida), e assim, dependemos de ajuda mútua para podermos sobreviver. 

Isso em termos fundamentais. Mas não podemos esquecer que também dependemos uns dos outros para realizar uma série de objetivos que consideramos importantes, mas que dependem de ajuda mútua para serem realizados, ainda que a ajuda chegue de maneira indireta. 

Este post, por exemplo, só pôde se tornar realidade porque outros resolveram compartilhar seus saberes (mas também porque outros proporcionaram um ambiente político relativamente pacífico, e outros criaram a rede de internet, e por aí vai).

Minha visão, então, é que a separação entre egoísmo e altruísmo é uma ilusão quando uma ação é realizada com base em um saber que reflete a realidade razoavelmente bem. Com esta afirmação, quero dizer que não existe isso de que o coletivo é superior ao indivíduo, ou vice-versa, em termos objetivos; trata-se apenas da aparência disso. 

Pois, em um dado contexto, a decisão com base em um saber que reflete a realidade razoavelmente bem pode ser uma atitude de cuidar de si, mas que indiretamente gera benefícios para o grupo (como no caso de decidir cuidar da nossa saúde, o que faz com que as chances de precisarmos utilizar e gerar custos para o sistema público de saúde, por exemplo, sejam baixas). 

Da mesma forma, uma decisão em prol do coletivo, com base em um saber que reflete a realidade razoavelmente bem, gera benefícios para o indivíduo, como implementar nas escolas uma educação voltada para o desenvolvimento das virtudes, o que pode fazer com que o indivíduo tenha maiores chances de ter sucesso na vida, uma vez que lhe será ensinado como lidar com suas próprias emoções para tomar decisões mais conscientes e também a importância de ir adquirindo mais e mais saberes sobre a realidade. 

Por sinal, vejo que dois dos maiores bens que podemos fazer a alguém é oferecer-lhe conhecimentos úteis que refletem a realidade razoavelmente bem e ajudá-lo a desenvolver o hábito de agir com base no seu saber do momento. Assim, contribuímos para que ele se torne mais capaz de realizar escolhas objetivamente boas, o que aumenta as chances de ele ter sucesso na vida. Não é à toa que Aristóteles defende que o Estado deve ter como foco primordial o desenvolvimento das virtudes dos cidadãos.

Note que o oposto também se aplica na relação entre bem de si e bem dos outros (e vice-versa) com base em um saber falso. Um indivíduo que vem roubando, achando que é certo fazer isso (um saber falso), gera um mal para o coletivo, mas também um mal para si, pois, mesmo que ele venha tendo alguns sucessos, a chance de ser descoberto representa um risco para si desproporcional em termos do bem que pode obter, uma vez que, caso seja descoberto, ele não só pode perder a confiança dos outros (e a disposição dos outros em ajudá-lo), mas também ser retaliado a ponto de ser expulso do grupo (o que, no caso de sociedades mais organizadas, representa ser preso) ou até mesmo ser morto. 

Por sua vez, um governo que acha que o melhor para o coletivo é doutrinar as crianças (um saber falso), ao invés de ensiná-las a raciocinar por elas mesmas, tomar decisões com base no que sabem, se interessar por adquirir mais e mais conhecimento, faz um mal para o indivíduo, mas também para o coletivo. 

Isso porque indivíduos que não conseguem fazer escolhas objetivamente boas são, em si, humanos que estão aquém da realização do seu potencial, são humanos fracos, e como tais, se tornam pesos para o coletivo em diversas instâncias, sobrecarregando o sistema prisional, judiciário e de saúde, por exemplo, e, acima de tudo, escolhendo mal os gestores do coletivo. 

E no caso de democracias verdadeiras (as que o povo, de fato, tem poder de decisão), indivíduos que não realizam seu potencial são pesos para o grupo, pois não conseguem contribuir com decisões refletidas a respeito de questões complexas que a sociedade da qual fazem parte está enfrentando.

Caso queira conhecer cada vez mais sobre Filosofia, convido você a participar do Grupo para Sugestões de Livros e Cursos que Elevam o Saber.

CLIQUE AQUI PARA PARTICIPAR

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O que é um bom ser humano?

Por que as pessoas são preconceituosas?

Por que as pessoas culpam as outras pelos seus próprios erros?