Por que limitar a liberdade não é necessário para a vida em grupo?

É comum a defesa de que a limitação da liberdade, mais precisamente da liberdade de escolha, é uma condição sine qua non para a convivência em grupo. No entanto, discordo dessa visão. Acredito que é possível viver em grupo e ainda preservar a liberdade de escolha, desde que o agente decisor não seja privado de ter contato com as consequências de suas ações, sejam elas boas ou ruins.

Nesse sentido, vejo as consequências como um fator gerador de equilíbrio e harmonia, algo que possibilita a existência de um ecossistema dentro dos grupos humanos, da mesma forma que observamos na natureza.

Em um pequeno grupo, como em uma tribo, é fácil identificar e punir um indivíduo que não está disposto a colaborar. A fofoca, por exemplo, cumpre a função de sinalizar quem não é confiável, como mencionei no post "Por que as pessoas fofocam?".

Porém, quando os seres humanos passaram a formar grupos grandes e complexos, a identificação e punição daqueles que se recusam a cooperar — incluindo aqueles que se aproveitam dos outros — se tornou mais difícil. A partir daí, o caos passou a imperar. Foi então que surgiu a necessidade de formalizar leis e garantir que elas fossem aplicadas, resgatando, por meio da criação de instituições, o poder do grupo de punir os desobedientes.

Contudo, as leis não precisam atacar a liberdade de escolha em si para gerar harmonia. Elas devem garantir que as consequências fluam, ou seja, que os atos sejam punidos conforme o desejo do grupo, mesmo que os infratores se escondam na multidão.

Um exemplo disso, embora mal visto, mas que deve ser compreendido como uma tentativa rudimentar de não limitar as consequências para garantir a harmonia, foi a implementação do Código de Hamurabi, famoso pela justiça do "olho por olho, dente por dente".

Certamente, o estado das coisas na Mesopotâmia antes da criação desse código era caótico, assim como em Atenas antes da implementação das leis draconianas. Não é por acaso que Draco foi louvado em sua época pelo efeito das suas rígidas leis, que, assim como o Código de Hamurabi, visavam garantir o fluir das consequências — embora de forma excessiva, já que muitos delitos eram punidos com a morte.

Portanto, acredito que a vida em grupo não depende da limitação da liberdade de escolha, mas sim da não limitação das consequências das decisões. Por exemplo, a não limitação da punição de políticos corruptos. A harmonia do grupo aumenta conforme as leis se refinam, permitindo que as consequências sejam proporcionais e conduzam ao aprendizado dos agentes que praticaram ações prejudiciais.

As leis, então, são importantes não para limitar a liberdade, mas para promover o fluir das consequências e o aprendizado após o exercício da liberdade de escolha. Se uma lei ataca a liberdade de escolha, como no caso da liberdade de expressão, ela perde o sentido de sua função — que é gerar aprendizado — tornando-se uma lei injusta.

Claro, nem toda lei criada resulta em aprendizado real. Um consenso entre as pessoas de um grupo sobre determinado tema não significa que aquilo seja verdade. Um grupo pode criar leis que ensinem falsidades, como no caso de sociedades que implementam leis para justificar a escravidão. Nesse caso, as leis seriam injustas do ponto de vista da realidade objetiva.

Porém, se a liberdade de escolha for preservada, ainda há esperança. Isso significa que, se o grupo não criou leis para atacá-la diretamente, muitas pessoas podem, por exemplo, expressar descontentamento com leis injustas, desobedecê-las e, eventualmente, fazer com que percam sua eficácia, levando à sua revogação — assim como a eliminação da prática prejudicial que elas incentivam.

Pensatas que criei e que têm a ver com o tema:

"A justiça não deve ser utilizada para limitar a liberdade em uma sociedade, mas para viabilizá-la, punindo o real mau uso dela."

"Uma verdadeira justiça viabiliza a liberdade punindo o real mau uso dela e, com isso, torna desnecessária qualquer iniciativa autoritária por parte dos governantes."

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