A importância da dúvida em tempos de certeza

A dúvida cartesiana marcou um ponto de inflexão na história do pensamento ocidental. Ao propor que tudo deveria ser posto em questão até que algo se mostrasse absolutamente indubitável, Descartes abriu o caminho para uma nova forma de rigor intelectual, uma ciência que se pretendia autônoma em relação à religião. No entanto, ao atacar as certezas de maneira tão radical, essa mesma dúvida atingiu também as certezas religiosas, abalando a confiança tradicional no fundamento divino do conhecimento.

Neste sentido, a fé moderna passou a ser atravessada pela dúvida, e, a partir dessa dúvida, surgiram novas exigências: (1) a necessidade de tratar as coisas como hipóteses; (2) a diligência de testá-las; e (3) tentar alcançar o sucesso nesses testes, que, em caso de comprovação, coincide com o alcance de verdades — ainda que provisórias.

Desse modo, a dúvida, ao invés de paralisar, transforma-se em atitude investigativa; e longe de dissolver o valor da verdade, acabou fundando um novo modo de relação com ela: a verdade deixa de ser algo dado e passa a ser conquistada por meio de hipóteses submetidas à prova.

É nesse sentido que a herança cartesiana continua atual. Em tempos de consensos rápidos e verdades proclamadas, lembrar que a ciência nasce da dúvida é essencial. O espírito científico não é o da afirmação, mas o da verificação; não o da crença, mas o do questionamento. Sob essa luz, todo negacionismo autêntico — entendido não como rejeição dogmática, mas como recusa em aceitar como verdade o que não foi rigorosamente testado — é mais fiel à ciência do que o afirmacionismo ingênuo. Afinal, a ciência se faz duvidando, inclusive de si mesma.

Pensata que criei e que têm a ver com o tema:

O "negacionismo" é mais científico do que o "eu acredito na ciência", pois ciência se faz duvidando da ciência.

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